Campeão brasileiro pelo Flamengo, há cinco anos, Andrade ostentava o título de técnico revelação do futebol nacional. Á época, preparava o plantel rubro-negro para a disputa da Libertadores da América e gozava das benesses trazidas a tiracolo do sucesso.
Passada meia década daquela conquista, o atual cenário parece não brindar as bodas dos seus melhores dias. Andrade, hoje com 57, está à frente do Jacobina Esporte Clube, time que retornou este ano à elite do futebol baiano após mais de 20 anos ausente.
As dificuldades da nova empreitada são inúmeras. Passam por falta de estrutura do clube, dificuldade na inscrição de atletas e, segundo o comandante, constantes erros de arbitragem.
Depois de uma exaustiva semana de viagens, porém, Andrade chegou a uma nova conclusão irreversível: "passamos mais tempo no ônibus indo treinar do que efetivamente treinando", diz, ligeiramente contrariado.
A explicação é simples. O Jacobina não tem campo de treino no município ao qual presta homenagem. A solução é se deslocar por 111 km (ou uma hora e meia de viagem) até Senhor do Bomfim todo dia. O treino dura cerca de duas horas. Depois, ainda tem a volta. Resultado: 3 horas de deslocamento x 120 minutos de atividade com bola.
Este impasse, acredita o técnico, tem gerado consequências diretas no desempenho da equipe no torneio estadual. Passadas quatro rodadas de seis da primeira fase, o 'Jegue da Chapada' figura na zona de rebaixamento como o vice-lanterna da competição -- com três pontos somados, mas nenhum triunfo.
"O time está evoluindo. Fizemos um grande jogo diante da Juazeirense fora de casa. E iríamos ganhar, mas o Davidson (meia da equipe) perdeu um gol de cara no fim do jogo. Acho que deu um branco e ele esqueceu de definir o lance", lamenta.
Andrade conta que na estreia do Jacobina o time tinha apenas 13 jogadores inscritos para a partida ante o Galícia, em Feira de Santana. "Não conseguimos escrever a maioria dos atletas e entrei em campo só podendo fazer duas substituições. Joguei com um lateral-esquerdo improvizado de zagueiro e um lateral-direito na ala esquerda. Ainda assim arrancamos um empate heroico".
Fé e mistério
O contrato de Andrade com o Jacobina vai até o fim do estadual, previsto para maio. Sua vinda ao clube foi intermediada pelo Pastor Manassés, hoje deputado estadual pelo PSB.
O religioso, que ganhou notoriedade no estado por manter um centro de recuperação para viciados em drogas, fundou uma empresa de marketing esportivo e se incorporou ao Jacobina. Meses antes, Andrade havia deixado o São João da Barra sem conseguir fazer o time ascender da Série C do Carioca.
O convite veio sem recusas. O pastor prometeu um time competitivo para se tornar a terceira força da Bahia, disputar a Série D do Brasileiro e uma excursão para a China no final do ano. "O projeto era ambicioso. Me senti desafiado e fui", conta o treinador.
Andrade mora desde dezembro sozinho em Jacobina. A mulher e os três filhos ficaram no Rio de Janeiro e, desde então, só vieram uma vez lhe visitar.
"Sou um cara fácil de me adaptar. O Rio é uma cidade grande e Jacobina bem pequena. Às 22h já não tem nenhum movimento na rua. O jeito é ficar vendo televisão dentro de casa", ri.
Seu salário é cercado de segredos. O presidente do Jacobina, Rafael Damasceno, diz não saber o valor. "A empresa do pastor Manassés fechou diretamente com ele. São eles que pagam o salário de Andrade. Não sei dizer quanto", diz.
Já o técnico, quando perguntado, prefere omitir. "É um assunto pessoal. Não gosto de falar disso", prega. A folha salarial do Jegue da Chapada é de R$ 200 mil, montante referente a 33 atletas do plantel.
Restam dois jogos para o Azulino não disputar os play-offs do rebaixamento. Andrade se diz confiante em virar o jogo e, de forma sintomática, relembra seus melhores momentos para fazer o pensamento transcender à dificuldade.
"Quando estava no Flamengo ganhei um campeonato em quatro meses. O Palmeiras estava 14 pontos na frente da gente e fomos lá buscar o resultado. Sempre é possível", fala.
Enquanto o ônibus viaja de Jacobina a Senhor do Bonfim o pensamento de Andrade corre junto para fazer o tempo passar. Não é difícil apostar que, em algum momento, repouse nostálgico naqueles anos dourados de 2009. (Uol esportes)
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